Estava lendo uma matéria hoje nas redes sociais sobre a proibição de discussões políticas pelo Centro Acadêmico dos Estudantes de Direito da UFMG (ver aqui). Essa é a segunda ocorrência de uma proibição proveniente de juízes de Direito(a) no Brasil.
Lendo uma outra entrevista no Cafezinho do ex-governador e político conservador, Cláudio Lembo (ex-Arena, PFL, DEM e atual PSD), o profissional de Direito lembrou que nos primeiros anos da Ditadura Militar ainda havia livre manifestação das ideias e somente após o AI5 houve o endurecimento do regime. Em 2016, sem impeachment formal de Dilma, já vemos os obscurantistas tomando o exercício ditatorial e tirânico do poder, prometendo retrocessos inimagináveis para uma sociedade complexa como é a brasileira. Estaríamos novamente às portas de uma ditadura, agora civil, orientada pelo Mercado?
O Brasil não é uma República das Bananas, tem mais de 200 milhões de habitantes, está entre as dez maiores economias do mundo, possui recursos naturais, energéticos, sociais, econômicos e culturais relevantes. E apesar de uma plutocracia anacrônica, derivada de exploradores coloniais nefastos, temos setores agrícolas, industriais e de serviços relevantes em nível mundial. Somos o centro estratégico da América Latina. O possível golpe de tipo “paraguaio” que pode ocorrer em nosso país, como o que Lugo sofreu há poucos anos atrás, cria um novo paradigma de intervenção imperialista no mundo.
Incorporamos por muitas décadas aquilo que foi apontado por intelectuais e militantes de vários locais do mundo como uma disputa de hegemonia em sociedades complexas de tipo ocidental. O combate à ditadura nos proporcionou avanços importantes nos direitos civis e políticos, sobretudo na aprovação da Constituição de 1988 e que culminaram em avanços nos direitos sociais, sobretudo a partir dos governos Lula e Dilma.
Como pontua muito bem André Singer, isso não envolveu corações e mentes das mais de 30 milhões de pessoas incorporadas ao mundo do Trabalho, ao consumo e à cidadania concedida. Assim como os avanços sociais e econômicos criados de cima para baixo pelos governos de Getúlio Vargas leva um “tempo até cair a ficha” das pessoas. E um vídeo da Laís Vitória revela que apesar de muitas pessoas que estão recebendo uma casa do programa MCMV se colocarem contra o golpe, elas não conseguem sair para a rua para defender o “seu governo”. A cultura dos bestializados, dos marginalizados, daqueles que assistem os eventos históricos como (tele)espectadores persiste. A transição de classe em si para classe para si ainda não ocorreu.
Considero que hajam dois cenários apontados para um futuro próximo. O primeiro cenário está ligado diretamente àquilo que um filósofo chinês antigo chamaria de cerco e aniquilamento. Envolve o impeachment de Dilma, o uso mais intensivo das mídias, da indústria cultural com autocensura, restrição às redes sociais e internet, uso dos antigos poderes (ex)republicanos para sufocar a pluralidade política e uma intervenção neoliberal para a ocorrência do superlucro para as oligarquias. Isso envolveria o desmantelamento de organizações da sociedade civil e o aniquilamento daquilo que se pode chamar de campo progressista. O apoio crescente ao fascismo por parcela da população rica e de classe média está evidente e no mínimo fica claro nos 8% de intenção de voto para presidente para Bolsonaro. O consentimento de outros setores sociais poderá nos levar ao fascismo neoliberal.
O outro cenário é de forte resistência social e a disputa de hegemonia. É inequívoco que desde 2013 tivemos o fortalecimento da sociedade civil organizada e que ela tem atuado muito mais, por exemplo, do que em 1964. Os movimentos sindical, sem terra e sem teto estão ao lado de movimentos da juventude e culturais, como a blogosfera, o que demonstra uma grande vitalidade para as lutas futuras. Há uma parcela da sociedade contrária ao golpe de Estado e a repercussão internacional é quase unanimemente contrária ao que está ocorrendo. A luta agora é pela sobrevivência, pela manutenção dos direitos conquistados. Mas terá de envolver a disputa da opinião das pessoas e a construção do exercício da cidadania. A lição de casa não foi feita nos últimos anos e isso parece ser essencial para retomarmos a pauta progressista em nível nacional e latino-americano.
Ao que tudo indica, naquilo que tem sido apontado como prioridade pelo bloco golpista (setores financeiros, industriais, meios de comunicação convencionais, setores dos poderes judiciário e parlamentares), a pauta será a retomada do neoliberalismo. Isso envolverá aumento do desemprego, redução do “custo Brasil” (diminuição de impostos, retirada de direitos consagrados na Constituição e da CLT) e privatariação de empresas estatais, além de desregulamentação, de “amarras” ao mercado (Ver os comentários de Juca Kfouri). Isso tudo em meio a um ambiente recessivo. A vidraça tentará aplicar remédios amargos sem aprovação popular e tornando evidente que as denúncias do campo progressista eram verdadeiras.
No primeiro cenário, mesmo com o aparente locaute de alguns setores econômicos, sabe-se que a governabilidade sobre a economia não é simples. Há uma inércia que governa as expectativas e tomadas de decisão para a retomada da economia. A aplicação deste receituário recessivo e de acumulação de capital em uma sociedade crescentemente autoritária pode ser um erro que levará a contradições no bloco conservador em meio a massivas manifestações contra o regime e a política do governo golpista.
No segundo cenário, sabemos que uma eventual derrota dos golpistas no Senado nos levaria a um governo com minoria parlamentar, fraco, com a plutocracia no nosso pé. O terceiro governo Dilma teria de ser aquilo que foi conclamado nas eleições 2014: um governo voltado para o combate ao desemprego, que retome o crescimento econômico através do MCMV, do PAC da agricultura, do crédito e das políticas sociais. Usar o poder de compra do Estado para retomar o comando do país. E preparar a pauta das eleições 2018, que tem de ter a reforma política e a democratização dos meios de comunicação como pontos centrais de uma nova abordagem comunicacional que transcenda este texto chato que você leu até agora... rs
Ainda nesse segundo cenário, mesmo com o impeachment de Dilma, teremos uma mártir e um forte combate ao neoliberalismo e ao fascismo plurireligioso. O ambiente econômico não muda da água para o vinho e teremos muitas greves. As manifestações sociais em uma recessão nos leva para um debate na esfera pública que pode e deve exercitar a contradição entre as oligarquias e o declínio contínuo da importância do PIG pode ser explorado (com ou sem golpe, mídias convencionais estão em franca decadência). Estaremos na ofensiva e com grandes chances de reversão do contexto.
Assim, concluo que a luta social é o melhor caminho e que a democracia continua sendo dominante em nossa sociedade. Nas redes sociais, nos papers, nas ruas, nos ônibus, em qualquer lugar. É usarmos a energia e não entrar em refluxo. Porque a verdade está lá fora, nos arquivos X dos EUA e de países centrais... e eles não estão de brincadeira! Mas me nego a responder positivamente à pergunta inicial porque a maioria da sociedade não é autoritária e o jogo está sendo jogado. A democracia prevalecerá, com governo fraco ou até ilegítimo e reacionário. Teremos arranhões na democracia, mas #nãopassarão!
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